O dia dos meus anos



Muito dobrada e gasta pelo tempo, guardo no álbum uma foto do dia do meu terceiro aniversário. Um fato azul por certo costurado pela mãe, e uma pose de bem comportado, que toda a gente que me conheceu na altura é unânime em dizer que me assentava bem.
De sonso, diria eu.
Porque desde cortar o meu próprio cabelo com uma tesoura, de usar uma extensão eléctrica como microfone e ter queimado o queixo quando a liguei à corrente, para além de ser o maior consumidor de Mercurocromo da reserva que a minha saudosa vizinha Irmã Madalena tinha no hospital; de tudo fiz.
Adorava contar histórias que eu inventava e de as escutar, aproveitando os serões de inverno para me abraçar às minhas tias e às minhas avós que usavam uns xailes fantásticos, macios e quentes.
E gostava muito de rir.
Hoje é dia 5 de Julho e cumpro 49 anos tendo passado já quarenta e seis anos desde a estreia do fato azul.
Hoje já não cortei o cabelo, mas aparei a barba grisalha, cantei sem acesso a qualquer tomada e pus o creme habitual dispensando o Mercurocromo.
Escrevi um poema de amor da mais bonita história e vou a correr dar um beijo e um abraço aos meus pais; não ao serão mas ao almoço.
Sem xaile, porque é verão, mas jamais haverá calor igual àquele que os seus olhos me oferecem quando me dizem que jamais alguém me amará assim dessa forma tão completa.
Talvez também cante no carro enquanto cruzo a planície, pensando por certo no meu irmão, no João, no Luís, na Fátima, na família e nos amigos todos que me oferecem os dias felizes; pensarei na pessoa mais bonita do universo que chegou para me ensinar que o amor pode ser tudo o que sonhamos; e rezarei o terço como o faço em viagem, por entre a fé que me assiste e que é muito maior do que qualquer convenção estabelecida pelos Homens.
E rir-me-ei muito... por tudo e pela alegria imensa de gostar e de me orgulhar de mim no previsível e nas diferenças.
Sozinho, sigo naquele estado que aos mais distraídos até pode parecer solidão; como se quem ama assim não tivesse sempre o mundo inteiro nos seus braços.
E sigo indiferente ao tempo e à idade, porque os dias todos que chegarem só os quero para ser feliz… contigo.
Um abraço do Quim para todos.

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