Diversidade e tolerância (Férias – Dia 3)

Seguimos pelo granito e buscamos Sortelha no cimo do monte que serpenteamos através de uma sucessão de íngremes curvas e contra-curvas que quase parecem rotundas inclinadas.
Passando as portas do castelo, a surpresa vem de um palco que anuncia festa para essa tarde, mas maior surpresa é o meu pai encontrar por ali inesperadamente o seu conhecido Sr. Júlio que é mestre de tirar cortiça lá para os lados da nossa terra.
É que o palco receberá hoje o Rancho Folclórico de Evoramonte e aqui, nos recantos de uma fortaleza Beirã “inventada” pelo nosso segundo rei, D. Sancho I, para nos defender dos arqui-inimigos Castelhanos, as modas que se ensaiam são da planície, entre saias e canto-chão.
A viola campaniça casa hoje com o adufe e a diversidade cultural é prova da riqueza da nossa identidade lusa, que mais do que um espaço delineado por fronteiras que nos separam de quem quer que seja, é esta “festa” da gente que fala a mesma língua.
E em Português falamos com o João, um rapaz que tem o seu café instalado numa velha casa de pedra devidamente recuperada, que tem à porta uma mega-abóbora digna de ter nascido no Entroncamento, e que juntamente com a bica nos serve um fresquíssimo licor de folhas de figueira; enquanto eu olho pela pequena janela e descubro que ali e com aquelas vistas, eu, Alentejano de gema, teria inspiração de sobra para escrever sobre o que quer que fosse.
Quando descemos de Sortelha levamos Belmonte como destino, e no velho convento feito Pousada em que os quartos não têm números mas nomes de frades, folheamos o menu que tem tudo o que possa saciar um qualquer cristão ou judeu.
E qualquer cristão alojado na cela do Frei Carlos poderá brindar ao almoço com um bom vinho kosher, que afinal até foi a bebida utilizada por Jesus Cristo na última ceia.
Mais tarde fotografamos uma cruz na entrada do Castelo, imediatamente antes de irmos visitar a Sinagoga.
Por aqui não há muros entre “fés”, não há pedras e bombas entre crentes nas diferentes faces de um mesmo e único Deus. Os profetas são diferentes, mas que importa? O que é que é mais importante, a carta com uma mensagem importante ou o carteiro que a traz?
Da praça do Castelo que celebra Pedro Álvares Cabral, que por aqui nasceu, a universalidade expressa em quatro bandeiras colocadas no cimo de outros tantos cantos da Torre de Menagem: Belmonte, Portugal, Brasil e União Europeia.
Os castelos já não separam e podem unir, que o digam as bandeiras e também todos os que descansamos sentados no anfiteatro ao ar livre assistindo a uma performance improvisada das crianças de uma família de luso-descendentes, com as línguas mães de Camões e Vítor Hugo entrelaçadas nas mesmas almas.
Por entre os que estamos sentados há de tudo e vislumbram-se todas as diferentes faces do amor, esse estado perfeito que nunca terá idades, fronteiras, etnias, línguas, género ou crenças.
E pela tolerância… máxima regressamos a Monfortinho com uma paragem breve na Senhora da Póvoa.
Nós e o silêncio perfeito do campo numa tarde quente de verão.

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