O príncipe que não sabia o que era a poesia

No seu castelo com janelas grandes rasgadas para a serra, parapeitos adornados de tulipas que nos dias de vento deixavam entrar o aroma fresco da maresia, porque o Atlântico não ficava longe; vivia um príncipe de olhar sereno e sorriso feliz.
O jardim era o seu mundo, e o seu confidente nas brincadeiras, nos sonhos e nas angústias, era um enorme pé de abacate que lhe dava abrigo, sombra e lhe retribuía em frutos verdes e gigantes, o afecto feito de tantos cuidados e carícias.
Às vezes nas tardes mais quentes, sentado junto à janela do primeiro andar, ou mesmo junto ao seu pé de abacate, o príncipe lia os livros guardados na biblioteca do castelo, apreciava a prosa que o fazia sonhar, mas ficava sempre triste quando tentava entender os poetas.
As palavras destes pareciam-lhe vagas e o príncipe ficava sempre triste por não poder e não saber entender a poesia.
Este sentir manteve-se sempre igual, até que numa tarde quente e risonha de primavera, estando ele entregue aos seus pensamentos à sombra do seu pé de abacate, o Deus que sempre cuida do coração dos Homens, lhe apareceu num pensamento e lhe deu as coordenadas de um caminho.
E disse-lhe:
- Vai e aprenderás o que é a poesia.
O príncipe que sempre vivera ali fechado no seu castelo, não hesitou, de pronto preparou a mochila com algumas poucas coisas de que necessitava, e fez-se à estrada seguindo as indicações deste Deus que não tem nome mas que todos conhecemos.
Subiu estrada fora, península arriba e foi dar a uma terra verde da cor dos seus abacates, uma terra onde corriam incansáveis rios e ribeiras, uma terra onde os Homens cantavam com fé ao som de gaitas e brindavam com o “vinho” que sabiam colher das macieiras.
Aí, o príncipe apaixonou-se na hora em que alguém chegou e lhe entrou de rompante por todos os sonhos.
E sem saber como, e sem que o Deus dos apaixonados lhe tivesse voltado a aparecer em pensamento, o príncipe regressou ao seu castelo, ao seu pé de abacate, às janelas para a serra que traziam o cheiro a maresia… e começou a ler e a entender finalmente todas as palavras dos poetas, até aquelas que pareciam indecifráveis.
Cumprira-se a profecia do Deus do amor em conversa tida numa tarde de primavera.
Afinal, a poesia é a linguagem das almas apaixonadas, e o príncipe enamorado e com o coração lá longe entre os bosques onde habitam deuses e sonhos, aprendeu por tudo e também pela saudade, os segredos desta “fala” que expressa os sentimentos, mesmo os mais profundos.
E o príncipe viveu feliz para sempre no seu castelo, com as suas plantas, o mar, os seus sonhos e claro, a poesia.
Álvaro José, muitos parabéns pelo teu aniversário.
Desculpa a brincadeira mas terias de figurar na galeria de textos dos meus amigos.
E nesta coisa dos poetas, eu nunca consegui perceber como é que tu não os entendias, tu que pela tua generosidade e amizade, és afinal uma pessoa ao jeito de um “verso” do melhor que tem a poesia.

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