E apenas o desejo coerente e nosso
Da nossa tarde trouxe palavras infinitas que vou
guardando em folhas brancas desenhadas a tinta de cor azul, e trouxe algumas
fotos que tirámos e que eu vou revendo, sentindo às vezes por momentos, quase
sempre que regresso do voo do pensamento, que as olho a sorrir.
Gosto particularmente daquela em que os nossos pés
parecem beijar-se sobre o chão da beira Tejo, e sei bem do que falávamos por
ali sentados enquanto um paquete dizia adeus a Lisboa, as ondas se entretinham esforçada
e ruidosamente a calar a maré baixa e nós brincávamos com a elegância e a
modernidade dos nossos sapatos.
Falávamos de futuro...
O mesmo futuro que nos fez caminhar depois mais um
pouco de frente para o sol poente e nos ofereceu o instante de um abraço.
O espaço iluminado pelas paredes num tom lilás a
lembrarem os campos da planície onde cresci a sonhar contigo...
O espaço que não consegue abafar o ruído estridente do
eléctrico nos carris ousados de uma das curvas do Chiado, e que deixa vir até
mim a Lisboa onde as ruas guardam grafitis tatuados pela minha solidão que
chamava por ti...
E aquele abraço…
Nós e apenas o desejo coerente e nosso, na ausência total
de “espaço” para as convenções e para as alfombras da moral.
Nós na verdade e na confluência vibrante de todos os
sentidos.
Nós a voarmos, porque um Homem voa quando prende os
braços a quem ama.
Não tive tempo de o dizer, pois breve dissemos o
costumeiro até logo com que tentamos amenizar a despedida, e partimos por entre
o cheiro a manjerico e a Santo António; mas digo-o agora assumindo-o
inteiramente aqui: no domingo dei o melhor abraço de toda a minha existência.
Melhor, não dei, foste tu quem o ofereceu ao infinito desejo
que durante toda a vida esperou que chegasses por entre um amor assim… perfeito.
O melhor abraço de sempre. Fica escrito para que
sempre seja lembrado assim.
No regresso a casa, o volante já não estranha o gosto
a sal que as minhas mãos lhe oferecem sempre que estou contigo. É que os olhos
de tão entretidos a sorrir deixam escapar detalhes líquidos de uma alma que
transborda felicidade.
E depois, até os meus pés têm saudades dos teus… e da
beira Tejo.
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