Com compras, sem preços de saldo, enervado, a baixar o volume do telemóvel… e com vontade de fazer “ensaladilla de gambas” para o almoço de amanhã


Sair do trabalho às 15 horas de uma Sexta-feira e ir fazer compras para o El Corte Ingles para aproveitar os saldos é definitivamente uma doce ilusão.
Em primeiro lugar porque os saldos são uma festa que as lojas organizam para juntar anorécticos e obesos, e em que nós, os dos tamanhos médios (e perdoem-me a relatividade e o bom gosto da expressão… e nem sequer vale rir), ficamos à porta sem direito a constar nas “guest lists”; agarrados às prateleiras e aos preços sem descontos e pré-depressão da “Nova colecção”.
Já não estando muito bem-disposto por esta descoberta, pior fiquei quando descobri que eu por ali e àquela hora resultava numa combinação demasiado contra-natura; é como entrar num mundo que por estas horas não nos pertence, dominado que está pelos reformados e idosos, que à falta de bilhetes para irem assistir às gravações dos programas do Fernando Mendes e da Júlia Pinheiro, foram para ali passar a tarde.
Todos os sítios servem para as suas tertúlias…
À frente das caixas multibanco estacionam a discutir códigos e saldos, e mesmo depois de nós termos manifestado a nossa impaciência com um ligeiro sopro e o cartão a bater ferozmente na carteira, ainda ajeitam as notas e os talões nas suas carteiras com toda a calma do mundo, procurando depois o melhor sítio da mala ou do bolso para só depois então saírem, ainda hesitando se saem pela direita ou pela esquerda, discutindo uns com os outros sobre as vantagens de um e outro lado.
Não há funcionários disponíveis pois estão todos ocupados a responderem às listas infinitas de dúvidas que acodem a esta gente. Primeiro que consigamos que eles nos respondam “46 de calças só na nova colecção”, é de morrer.
E depois há o item “toque do telemóvel”.
Com a surdez que a idade vai promovendo, os toques são num volume para lá de amanhã e com conteúdos tão sugestivos como bebés a chorarem ou cavalos a relincharem num estábulo da Praça de Touros da Moita.
Acho que definitivamente devem patrocinar uma revisão dos ditados populares e decretarem o “diz-me como toca o teu telemóvel e dir-te-ei quem és”.
No fim da saga de compras e estando num território que quase se pode considerar uma embaixada de Espanha, identifiquei no corpo uma vontade louca e algo interessante de “ensaladilla de gambas com una caña y unos picos”.
Em vão. O balcão de Tapas está fechado a estas horas (claro) e tive de ir para um outro com chás, cafés e pastelaria variada.
Onde estava quem?
Exactamente.
Todos os membros inscritos na Associação Portuguesa de Universidades Seniores em passeio anual e excursão ao El Corte Ingles de Lisboa, com lanche incluído.
Confesso que estive para perguntar a três senhoras à minha frente, daquelas que têm más relações com as cabeleireiras e usam cores indefinidas nos cabelos, ali entre o cinzento e o roxo; se não queriam que eu fosse buscar uns banquinhos para estarem mais confortáveis.
É que tanto tempo por ali em pé a discutir esse assunto de crucial importância que é o Pastel de Nata com ou sem canela…
Mas não, contive-me até ao meu chá de camomila com uma empada lusitana que definitivamente não apagou a fome de “ensaladilla”, e saí do parque de estacionamento passado algum tempo, e ainda a tempo de ver os polícias em São Sebastião a controlarem as matrículas dos carros mais antigos e que agora não podem circular na cidade com risco de a Câmara ter de pagar uma taxa à União Europeia por excesso de Monóxido de Carbono.
Não é este Presidente de Câmara que diz querer ser Primeiro-Ministro para ir “bater o pé” e renegociar dívidas?
Pois…
E cheguei a casa à hora a que chego todos os dias.
Com compras, sem preços de saldo, enervado, a baixar o volume do telemóvel… e com vontade de fazer “ensaladilla de gambas” para o almoço de amanhã. 

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